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Investigar e processar poluidores e seus facilitadores como financiadores
Por meio de uma variedade de mecanismos legais, pessoas e entidades em todos os níveis devem iniciar investigações e ações judiciais que responsabilizem as indústrias poluidoras e destrutivas e seus facilitadores por seus papéis multifacetados na crise climática e irregularidades.
Como seria isso?
Estados, regiões, comunidades e/ ou indivíduos lançam formalmente investigações sobre indústrias/empresas e atores poluidores e destrutivos para estabelecer com firmeza o que sabiam sobre a mudança climática, quando e quais ações tomaram ou não tomaram para lidar com essas descobertas.
A investigação e as ações judiciais em relação ao agronegócio podem ser feitas com base em danos diretos ou eco-destruição causados por práticas comerciais.
Estados, regiões e/ ou comunidades processam formalmente as corporações da indústria poluidora para obter compensação pelos danos causados ou projetados como resultado de suas práticas comerciais, falha no cumprimento dos compromissos de ação climática ou fraude e manipulação.
A compensação recebida deve apoiar diretamente as comunidades da linha de frente e aquelas que sofrem o abuso direto de indústrias poluidoras e destrutivas, ou para os fundos que distribuem para essas comunidades como os detalhados, aqui.
Registrar ações judiciais junto a órgãos judiciais nacionais e internacionais para expor e contestar os danos e abusos (ambientais ou relacionados a pessoas e comunidade) sofridos como resultado de projetos específicos ou práticas comerciais de corporações transnacionais.
Essas reivindicações, especialmente quando apresentadas por comunidades locais, têm a capacidade de estabelecer precedentes inovadores que estimulam mudanças duradouras. Por exemplo, uma comunidade local de pescadores indianos lançou um processo que acabou criando um poderoso precedente legal para instituições financeiras internacionais por meio da Suprema Corte dos Estados Unidos. Leia mais sobre isso aqui.
Os sistemas judiciais devem garantir prazos prescritos específicos que devem ser uma questão de meses (não anos) e os Estados ou sistemas jurídicos são obrigados a cumprir quando as reivindicações de responsabilidade são registradas.
Abrir processos judiciais de responsabilidade contra os investidores institucionais e financiadores que permitem às indústrias/empresas poluírem, destruírem, abusarem e usarem a personalidade corporativa ou o véu corporativo como escudo.
Iniciar processos judiciais contra executivos e diretores de empresas financeiras que não consideram e abordam os riscos climáticos de forma adequada. Só 35 bancos de investimento –como JP Morgan Chase, Wells Fargo, Bank of America e HSBC– canalizaram mais de 2,66 trilhões de dólares em combustíveis fósseis entre 2016 e 2019.[1][2] Há cada vez mais precedência e potencial para processar atores corporativos –como financiadores– por violações de dever de cuidado e diligência.[3][4]
Nos últimos anos, os litígios sobre mudanças climáticas para antecipar reivindicações de responsabilidade têm aumentado significativamente nas jurisdições globais. No passado, a maioria desses processos foram movidos contra governos. Estamos agora, no entanto, testemunhando um foco cada vez maior no lançamento de processos de responsabilidade climática contra empresas com base em vários argumentos e reivindicações jurídicas robustas.[5][6] Essa mudança de foco na responsabilização jurídica das indústrias pelas mudanças climáticas foi facilitada pelos avanços na ciência de atribuição do clima; conhecimento de precedentes e desafios legais anteriores; aumento de evidências sobre os esforços das empresas na negação e enganação das mudanças climáticas; aumento da ação pública para responsabilizar as empresas pelas mudanças climáticas; e colaboração mais eficaz entre governos, advogados, cientistas e defensores em várias jurisdições e contextos jurídicos.
Alguns dos tipos mais proeminentes de reivindicações legais que podem ser utilizados para processar corporações direta, coletiva ou individualmente incluem, mas não estão limitados a:
Perturbação públic
Perturbação é um ato ou omissão que interfere nos direitos da comunidade ou no público geral. Alegações de perturbação pública se concentram no argumento de que a extração e promoção de combustíveis fósseis contribui para os impactos das mudanças climáticas, como a elevação do nível do mar, e que esses impactos criam uma perturbação pública que interfere nos direitos dos indivíduos ou comunidades representadas.
Negligência
A maioria das empresas poluidoras tinha conhecimento prévio da ciência e dos impactos das mudanças climáticas, em alguns casos décadas antes de serem comumente conhecidos pelo público. Ser capaz de demonstrar esse conhecimento prévio forma a base para reclamações de negligência relacionadas à violação de seu dever de cuidado por uma empresa, por não prevenir danos previsíveis e por falha negligente em alertar sobre a probabilidade desse dano.
Publicidade enganosa
Essas alegações se concentram na publicidade que enganou o público em relação às atividades de mudança climática da empresa, a natureza de seus produtos ou os impactos previstos das ações delas nas comunidades em sua cadeia de abastecimento. Casos de publicidade enganosa alegam que as campanhas promocionais e de publicidade por indústrias poluidoras violam a lei nacional ou mesmo as Diretrizes para Empresas Multinacionais[7] da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) , que exigem comunicações precisas entre empresas e pessoas.
Proteção ao consumidor
Essas reivindicações apontam as violações da lei de proteção ao consumidor, que normalmente proíbem as empresas de se envolverem em quaisquer práticas comerciais injustas e enganosas. Os demandantes nos processos de defesa do consumidor afirmam que as indústrias/empresas poluidoras promoviam seus produtos com campanhas de marketing e promoção enganosas e informações ambíguas que refutavam os achados científicos aceitos naquele momento histórico, dando origem a falsas evidências científicas e desenvolvendo materiais que impediram os consumidores de reconhecerem razoavelmente o risco dos produtos - combustíveis fósseis, neste caso - e os impactos significativos nas mudanças climáticas.
Responsabilidade objetiva
Em vez de alegar falta (como negligência ou intenção ilícita do réu), esses casos reivindicam responsabilidade objetiva por "defeitos de projeto" (ou seja, problemas com o design de um produto que tornam seu uso perigoso). Nos casos de combustíveis fósseis, por exemplo, o defeito é o impacto das emissões e os riscos conhecidos associados ao produto. Para que as reivindicações de responsabilidade objetiva sejam robustas, a evidência precisa mostrar que os réus envolvidos no negócio venderam o produto para demandantes, o produto foi usado como pretendido e causou danos.
Direitos humanos
A base dos direitos humanos em litígios relacionados ao clima concentra-se no papel das indústrias/empresas poluidoras em agravar as mudanças climáticas e o impacto relacionado aos direitos humanos de um indivíduo. Esses tipos de ações judiciais utilizam a legislação de direitos humanos para demonstrar as obrigações de indústrias poluidoras de respeitar os direitos humanos, como aqueles expressos na Declaração sobre os Direitos dos Camponeses, Camponeses e Outras Pessoas que Trabalham em Zonas Rurais.[8] Esses tipos de reivindicações demonstram que os instituições locais de direitos humanos também podem fornecer uma alavanca para ações futuras contra a mudança climática.
Outros tipos de reivindicações que têm o potencial de processar diretamente as empresas/indústrias destrutivas ou poluidoras para que assumem a responsabilidade jurídica delas incluem:
Injúria.
Ações administrativas.
Custos de recuperação da saúde e fortalecimento dos sistemas de saúde sanitária.
Violação do consentimento livre, prévio e informado, conforme reconhecido na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP).[9]
Violações da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres.[10]
Violações dos direitos consuetudinários (fundado nos usos e costumes) e tradicionais das comunidades.
Click here to read about the lessons learned para ler mais sobre as lições aprendidas com o precedente estabelecido em relação à responsabilidade legal na indústria do tabaco por meio da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco.
Implementação das medidas do roteiro de responsibilidade jurídica
Ao implementar as medidas estabelecidas neste roteiro, os tomadores de decisão e os movimentos em todos os níveis devem ter em mente:
A aprovação dessas políticas e medidas é simplesmente o primeiro passo para responsabilizar as indústrias poluidoras e destrutivas: haverá muito trabalho para funcionários do governo, tomadores de decisão, ativistas e sociedade civil para garantir que essas medidas sejam totalmente implementadas e nos levem em direção à mudança transformadora de que o mundo precisa.
A responsabilidade jurídica deve ser aplicada a todos os setores e empresas que tomam decisões de negócios que contribuem para as mudanças climáticas e tem impactos, ou que causam danos às pessoas e à natureza. Além da indústria de combustíveis fósseis, essas indústrias incluem, mas não se limitam a, a indústria do agronegócio, a indústria de madeira, papel e celulose, a mineração e o setor de energia.
Muitas dessas medidas podem ser igualmente aplicadas às empresas estatais. Como os contextos nacionais e as necessidades únicas variam de país para país, vale a pena considerar onde aplicar e como adaptar os princípios e medidas listados no roteiro de responsabilidade para lidar com as empresas poluidoras estatais. Ao fazer isso, os fatores a serem considerados podem incluir, mas não estão limitados ao grau de controle democrático na entidade, função, uso de financiamento de receitas de petróleo/ gás e capacidade de resposta da entidade para a transição para fontes de energia renováveis e regenerativas.
As medidas implementadas no nível nacional devem apoiar e reforçar, ao invés de contradizer, as medidas implementadas no nível subnacional e local, e vice-versa.
1 Patrick Greenfield and Kalyeena Makortoff, "Study: global banks 'failing miserably' on climate crisis by funneling trillions into fossil fuels," The Guardian, March 18, 2020, https://www.theguardian.com/environment/2020/mar/18/global-banks-climate-crisis-finance-fossil-fuels.
2"Banking On Climate Change," Fossil Fuel Finance Report, 2020, accessed August 28, 2020, https://www.ran.org/wp-content/uploads/2020/03/Banking_on_Climate_Change__2020_vF.pdf.
3 Alice Klein, "Governments sued over climate change, with banks and firms next," NewScientist, May 26, 2017, https://www.newscientist.com/article/2132927-governments-sued-over-climate-change-with-banks-and-firms-next/.
4 "First-Ever Lawsuit Over ‘Inadequate’ Climate Risk Disclosure Could Set New Precedent for Businesses," Sustainable Brands, accessed August 27, 2020, https://sustainablebrands.com/read/marketing-and-comms/first-ever-lawsuit-over-inadequate-climate-risk-disclosure-could-set-new-precedent-for-businesses.
5 J. Setzer and R. Byrnes. Global trends in climate change litigation: 2019 snapshot, Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment and Centre for Climate Change Economics and Policy, London School of Economics and Political Science, 2019, accessed August 25, 2020, https://www.lse.ac.uk/GranthamInstitute/wp-content/uploads/2019/07/GRI_Global-trends-in-climate-change-litigation-2019-snapshot-2.pdf.
6 Jennifer Hijazi, "Climate liability is on the rise. Here's what it looks like," E&E News, August 5, 2019, https://www.eenews.net/stories/1060850731.
7 "OECD Guidelines for Multinational Enterprises," Organization for Economic Co-operation and Development, accessed August 28, 2020, http://mneguidelines.oecd.org/guidelines/.
8 UN Human Rights Council. "United Nations Declaration on the Rights of Peasants and Other People Working in Rural Areas," resolution adopted on 28 September 2018, 39th sess., Geneva, accessed August 25, 2020, https://digitallibrary.un.org/record/1650694?ln=en.
9 The United Nations General Assembly. "Declaration on the Rights of Indigenous People," New York, 2007.
10 United Nations Human Rights Office of the High Commissioner. "Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women New York, 18 December 1979," accessed August 28, 2020, https://www.ohchr.org/EN/ProfessionalInterest/Pages/CEDAW.aspx.